quinta-feira, outubro 04, 2012

Neste puzzle há peças que não encaixam

Na nossa deslocação às Alcáçovas, aproveitamos para ir visitar a sua Igreja Matriz. Perante o que vimos e as informações obtidas, muitas interrogações se nos puseram.
 
Ao aproximar do local verificamos com agrado e perplexão - porque no Torrão não é hábito - que a igreja é alvo de limpeza constante.
À pergunta de se se podia visitar a igreja a resposta foi afirmativa e o cenário com que nos deparamos não podia ser mais diferente daquele com que nos deparamos no Torrão no passado mês de Março e que, convenhamos, está à vista.
A Igreja Matriz ou de S. Salvador está impecávelmente limpa e imaculadamente asseada e arranjada. As suas paredes são de uma alvura assombrosa o que revela que serão caiadas com relativa frequência. Ali não há fissuras nem nas paredes, nem nos altares, nem os frescos estão degradados ou remendados. Ali não há infiltrações de água pois não há qualquer mancha amarela ou de bolor em qualquer parede. Basta entrar e na primeira inspiração nos apercebemos do asseio. Cheira a limpo, cheira agradávelmente a limpo em contraste com o Igreja do Torrão, bafienta, com cheiro a mofo e a bolor. Os estrados onde assentam os bancos - que também eles se encontram bem preservados - são novos.
À saida elogiamos com sinceridade, e sabendo de antemão do estado de outros locais similares, a dedicação, a preservação deste património, a beleza arquitectónica da igreja, em suma, tudo o que merece ser digno de elogio e é-o com toda a certeza merecedor de tal.
Perguntamos se a igreja era limpa com regularidade. Foi-nos respondido que sim. Todas as Terças-feiras são dias de limpeza. Excepcionalmente, no passado Domingo, dia 30 de Setembro, que o foi devido ao facto desse ser o dia da cerimónia de tomada de posse do Padre Abraão, o novo pároco de Alcáçovas. A limpeza é feita não por pessoas ligadas à paróquia nem por funcionários camarários mas sim por uma pequena empresa particular de limpezas. Perante tal, impunha-se a pergunta óbvia de quem é que pagava às senhoras da limpeza. Comissão Paroquial? Câmara Municipal de Viana do Alentejo? Junta de Freguesia das Alcáçovas? Comissão Paroquial?
Ninguém nos soube (ou não quis) responder. Apenas nos foi dito que recebiam devidamente pelo serviço efectuado.
 
As óbivas, incómodas e necessárias questões surgem então:
 
Como pode ser tão grande a diferença entre ambos os monumentos? Como é que se justifica tão abissais diferenças? Como pode uma igreja, ambas matrizes, estar tão acarinhada, preservada, limpa e outra, qual parente pobre, qual patinho feio, suja, altamente degradada, bafienta, notoriamente abandonada, notoriamente desprezada e tudo o mais que as imagens mostram? Estamos a falar de duas localidades que distam entre si apenas 14Km e que são ambas povoações muito similares e com caracterísitcas idênticas?
 
Quem são os responsáveis em ambos os casos pela imponência de uma e pelo ocaso de outra?
 
Paróquia? Autarquias? Populações? Estados de alma? Quem ou o quê?
 
O assunto do estado das igrejas do Torrão, nomeadamente da Matriz já foi discutido algumas vezes em Assembleia de Freguesia. O Executivo, e em particular, o Sr. Presidente da Junta afirma insistentemente que tanto a Câmara de Alcácer como a Junta do Torrão reuniram com o Sr. Padre e que inclusive havia disponível uma verba de dez mil euros mas que os responsáveis da igreja não mostraram grande interesse e como tal nada mais pode ser feito. Não pomos em causa. Não conhecemos os factos e nas assembleias infelizmente nunca há contraditório...
É crucial e por estes dias é cada vez mais importante a inevitável declaração de interesse, ou seja, referir apenas isto: Foi dito e reafirmado em sessões públicas da Assembleia de Freguesia, note-se, para que posteriormente não venhamos a ser acusados, de forma pouco séria e falaciosa, de ter acesso a informação privilegiada e nos aproveitarmos de forma abusiva de tal facto. Foi, sublinhamos mais uma vez, dito em sessão pública da Assembleia de Freguesia. 
 
Perante tudo isto, e sabendo que ambas as paróquias pertencem à Província Eclesiástica de Évora, e que, mais do que isso, até à semana passada, ambas as paróquias tinham o mesmo pároco, há factos que parecem contraditórios, que são contraditórios, que não encaixam, que alguém nesta história estará a faltar à verdade e portanto pergunta-se:
 
Se tanto a Paróquia do Torrão como a Paróquia das Alcáçovas pertencem à mesmo província eclesiástica (Diocese de Évora) e se ambas as paróquias foram até há bem pouco tempo regidas exactamente pelo mesmo pároco, o Sr. Padre Jerónimo Fernandes, como é que se explica a diferença? Como é que uma igreja é filha e outra enteada? Como e porque é que a igreja do Torrão está num estado lastimoso e a de Alcáçovas está imaculada, está num brinco?
 
E, relativamente a verbas, qual a disponibilidade de cada uma das comissões paroquiais? E qual a fonte dessas mesmas verbas? Se há diferenças substanciais a que se deve tal desigualdade? Apoios autárquicos? Mecenato? Desigualdade na atribuição de verbas por parte da diocese?
 
Perguntas pertinentes que nunca ninguém faz, e pior, ninguém responde. A política do encobrimento, do fazer as coisas à sucapa, às escondidas, a política do esconde-esconde ainda são um facto mas felizmente em vias de extinção. Por isso nós estamos cá também, para ajudar a enviar essa política e esse modus operandi para o caixote do lixo. Estamos na era da informação e não na era do obsurantismo, não na era do fazer às escondidas, não na era do jogo de sombras. É preciso pôr uma pedra tumular em cima da política da meia-verdade, da mentira, do logro, da trapaça, do ronceirismo. Os torraneses têm que de uma vez por todas de estarem informados e saberem dos assuntos que dizem respeito a todos mas também têm que deixar de ser passivos, serem exigentes e participarem, aparecerem, darem a cara no momento da verdade. Tenhamos sempre em conta que haverá a minoria -  os mesmos de sempre, a meia dúzia de almárias que se arrasta há anos, há décadas por aí com os excelentes resultados que têm para mostrar e de que pelos vistos se orgulham, os elementos das duas ou três famílias que formam a «elite» local e que vão regendo isto a seu bel-prazer - que não o fará por razões óbvias. Seremos um povo de cobardolas? Depois admiram-se!
 
De ora em diante, as duas paróquias irão ser regidas por dois párocos distintos: a Paróquia do Torrão, pelo Sr. Padre Ivan e a Paróquia das Alcáçovas pelo Sr. Padre Abraão.
Implicitamente, foi dado a entender que a resposabilidade cabia exclusivamente aos responsáveis da paróquia e ao pároco em particular. Agora há um novo pároco, agora há factores novos mas também há factores velhos e que ainda se mantém. Veremos se haverão alguns progressos. Este artigo é também uma chamada de atenção e mais uma tentativa de puxar pelo brio e pelo orgulho dos torranenses. Seremos piores do que os nossos vizinhos? Seremos mais incompetentes, mais desleixados e menos do que eles de tal forma que nem do nosso património e da nossa memória colectivos somos capazes de cuidar? Será este apenas um problema de lideranças e de uma elite caduca e incapaz? Perante as evidências e a força das circustâncias somos obrigados a afirmar que sim.
Mais uma vez se reafirma que não se trata aqui de uma questão religiosa, não se trata de favorecer uma religião. Trata-se tão só de zelar pelo património histórico-arqutectónico da freguesia até para que, quando alguém nos visita, nomeadamente as televisões não falemos envergonhadamente do patromónio e para que quando alguém quiser ver «in loco» vir dizer-se, à laia de pretexto, que as portas estão fechadas e outras desculpas do género. E, pior ainda, se nada for feito, o colapso ainda que parcial será inevitável. No estado em que as coisas estão, a ruína é uma ameaça real e avizinha-se mais que certa. Resta saber depois é - e já que Alcáçovas é aqui uma constante, é inevitável fazer referência à sua arte maior - quem irá pôr o chocalho ao gato.
 
Igreja Matriz das Alcáçovas









 Fotos: Paulo Selão
 
 
Ceromónia de tomada de posse do novo pároco de Alcáçovas
Foto: Padre Jerónimo Fernandes in Facebook



Igreja Matriz do Torrão







Fotos: Paulo Selão in Pedra no Chinelo

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